Mudanças Climáticas: novas perspectivas para o mercado de trigo
A quebra de safra no Sul do Brasil, desafios trazidos pela geopolítica, guerra e o Clima extremo estão tornando cada vez mais difícil prever os movimentos do mercado internacional do trigo.
“A Rússia ainda domina o mercado do trigo, mas o Brasil se tornou exportador desse produto, o que adiciona novas camadas de complexidade na precificação interna, já que o país passa a depender mais das dinâmicas globais”, explica o executivo Pedro Sampaio.
Com o objetivo de fornecer informações estratégicas sobre o mercado global e auxiliar na tomada de decisões, a Associação Brasileira da Indústria do Trigo (Abitrigo) destaca alguns pontos importantes:
Nos EUA, as perspectivas são otimistas para a próxima safra. O diretor Regional da U.S. Wheat Associates, Miguel Galdos, disse que nos últimos 45 anos, os EUA mantiveram exportações ininterruptas para o Brasil, com volumes que variaram de um navio até três milhões de toneladas, dependendo da demanda.
O Departamento de Agricultura dos EUA (USDA), estima uma produção de 53,7 milhões de toneladas para a safra 24/25, superando as 49,1 milhões da temporada anterior.
“Esse aumento significativo é resultado de melhores rendimentos, proporcionados por condições climáticas favoráveis e pelo desenvolvimento de novas variedades”, disse, salientando o papel das universidades norte-americanas no desenvolvimento de variedades que combinam alta produtividade e qualidade.
Foto: Divulgação Abitrigo
Exportações
A estimativa envolve um aumento de 19,2 milhões de toneladas, registrado em 2023/2024, para 22,5 milhões de toneladas em 2024/2025. Galdos ainda ressaltou a crescente participação da classificação Red Spring nas Américas.
"O Soft Red é bem conhecido no Brasil, mas estamos vendo um aumento na entrada do Red Spring, especialmente em toda a América", explanou o executivo, acrescentando que a qualidade continuará sendo um dos principais focos da produção de trigo nos Estados Unidos.
Paraguai: aumento na exportação para o Brasil
Com uma área de plantio estimada em 390 mil hectares na safra 24/25, o panorama é positivo para o Paraguai.
"Apesar das condições climáticas adversas no ano passado, principalmente para a produção de sementes, observamos um crescimento surpreendente na adoção do trigo, especialmente na região do Chaco, onde tradicionalmente a soja domina", informou Guido Vera, assessor da empresa paraguaia Unexpa.
Ele também mencionou a forte conexão genética entre as variedades de trigo paraguaias e as brasileiras, o que facilita o acesso do produto ao mercado brasileiro. Vera mencionou que a produção deste ano superou as expectativas, alcançando 1,2 milhão de toneladas de trigo, com o consumo interno estimado em 650 mil toneladas e 100 mil toneladas destinadas ao uso doméstico de qualidade inferior.
"Isso nos deixa com um saldo de exportação de 400 mil toneladas, uma quantidade significativamente maior em relação aos anos anteriores", falou o assessor. O rendimento também foi expressivo, com média de 3 mil quilos por hectare, superando os 2,1 mil quilos por hectare registrados na safra anterior.
O Brasil continua sendo o principal destino do trigo paraguaio, e as exportações já aumentaram em 100 mil toneladas desde setembro, impulsionadas por problemas climáticos no Paraná. O assessor revelou que a futura habilitação da nova ponte entre Presidente Franco, no Paraguai, e Foz do Iguaçu, no Brasil, facilitará o fluxo comercial por caminhões entre os dois países, reforçando a importância do Brasil como parceiro comercial.
Argentina: vendas expressivas possibilitam recuperação de mercado
A analista de Cultivo do Trigo na Bolsa de Cereais, Daniela Venturino, traz números positivos para o comércio internacional argentino.
"Já foram vendidas 3,28 milhões de toneladas de trigo deste novo ciclo, o que representa um aumento de 93% em relação à safra 2023/2024", comenta. No entanto, ela alertou que, apesar do crescimento em relação ao ciclo anterior, o volume é 37% menor do que a média das últimas cinco safras.
Daniela chamou a atenção para o fato de que, até o momento, essas vendas representam 17% da produção esperada, um avanço de 6 pontos percentuais (p.p.) em comparação ao ciclo anterior. Ainda assim, o valor está 13 p.p. abaixo da média dos últimos cinco anos, sinalizando que há espaço para novas negociações.
"A comercialização está caminhando de forma acelerada, mas ainda estamos abaixo da média histórica", pontuou a analista.
Em relação às exportações, a Argentina já possui 11,95 milhões de toneladas programadas para venda, com as operações de exportação previstas para iniciar em dezembro. Esse movimento, é crucial para o país, que segue como um importante fornecedor de trigo na América do Sul, com o Brasil como um de seus principais mercados compradores, complementa a analista.
Uruguai: clima pode impactar produtividade e exportações
A coordenadora da Área de Cadeias Agroindustriais do Ministério da Agricultura do Uruguai, Catalina Rava, aponta uma redução na produção de trigo em relação ao ano anterior.
“Estimamos uma área plantada de 340 mil hectares, uma queda de 3% em relação à safra anterior, e uma produção projetada em 1,4 milhões de toneladas, o que representa uma redução de 19% quando comparado às 1,7 milhões de toneladas colhidas em 2023/2024”, afirmou.
Ela ressaltou que o recorde de produtividade do ciclo anterior, com mais de 5 mil quilos por hectare, não será mantido este ano, sendo esperado um rendimento de 4,2 mil kg/hectare.
Rava ainda disse que mesmo com a queda nos preços do trigo, o Uruguai conseguiu manter uma área semeada significativa, inclusive em comparação com outros cultivos.
“No Uruguai, o trigo não é transgênico e compete com outras culturas pela área plantada. A baixa no preço permitiu que tanto o trigo quanto a cevada mantivessem uma boa área de semeadura”, destacou.
No entanto, as condições climáticas são motivo de preocupação. “A ausência de chuvas tem sido um problema. As previsões indicam que os próximos três meses terão chuvas abaixo do normal, o que pode afetar ainda mais a produtividade”, completou.
No campo das exportações, o Uruguai registrou números positivos no ciclo comercial de novembro de 2023 a outubro de 2024, com embarques de 1,4 milhões de toneladas de trigo, o dobro do volume no ciclo anterior (700 mil toneladas). "O Brasil representa 54% do total que exportamos", sinalizou Catalina.
Mar Negro: preços agressivos resultam em restrições comerciais
O executivo da Louis Dreyfus Company (LDC), Guillermo Benedit diz que as exportações da Rússia começaram de forma agressiva, atingindo níveis próximos ao recorde do ano anterior.
“No ciclo 2023/2024, a Rússia exportou cerca de 55 milhões de toneladas de trigo, e para 2024/2025 a estimativa é de 44 milhões de toneladas”, explicou Benedit, destacando que, mesmo com uma queda de 11 milhões de toneladas, os embarques continuam fortes, com 5,5 milhões de toneladas sendo exportadas por mês entre agosto e outubro.
A agressividade russa no mercado internacional trouxe consequências. Benedit mencionou rumores de uma possível limitação nas exportações do país, devido ao alto volume exportado a preços baixos.
“A União de Exportadores de Cereais da Rússia alertou para esse ritmo intenso e preços muito baixos. Uma das maneiras de limitar essas exportações seria por meio de barreiras técnicas”, comentou o executivo, reforçando haver sinais de que essas restrições já começaram, com relatos de problemas fitossanitários em alguns navios de novos exportadores, sugerindo o início de medidas de controle.
Na Ucrânia, o impacto da guerra continua a prejudicar a logística de exportação.
“Com os bombardeios constantes nos terminais do porto situado em Odessa, o país pode ser forçado a encontrar novas rotas logísticas, aumentando custos e o tempo de exportação”, afirmou Benedit.
Mesmo com os desafios da guerra, as condições produtivas do país permanecem favoráveis, com o ritmo de semeadura do trigo de inverno ligeiramente superior ao ano anterior (59% contra 54%). O conflito fez com que a área plantada na Ucrânia caísse para 4 milhões de hectares, uma redução drástica em comparação aos 100 milhões de hectares anteriores à guerra.
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